Snake - Cada vez bem mais forte
Eu conheci o Snake há uns anos quando ele cumpria pena no Linhó. Ainda eu era miúdo quando ele andava pelo o bairro da cadeia a trabalhar no duro para ganhar uns trocos. Ele adorava o meu irmão mais novo e brincava com ele, dando-lhe a inchada para a mão para ele os ajudar como se fosse gente grande, longe da vista dos guardas, o que fez com que o meu irmão dissesse: - “quando for grande, quero ser preso”. Ainda assim havia sempre tempo para uns improvisos e troca de ideias junto à cancela da entrada. Estava eu a dar os primeiros passos na música quando me juntava ai com eles. Com o cenário característico, carregado de personalidade, saído directamente de um videoclip americano, gravado algures em Brooklin, mostrava um grande amor ao Hip Hop….mal nós sabíamos que quando saísse, se ia lançar como MC e relançar a sua vida dessa modo.
Passado uns anos, convidei-o para ir cantar na festa anual dos reclusos juntamente com o Sam The Kid - que tinha ido para o porto nesse dia e não conseguiu comparecer -. O Snake acabou por não cantar, mas esse regresso foi uma oportunidade para rever os amigos que fez enquanto esteve no Linhó. Ninguém se esqueceu dele e todos o puxavam para falar com ele e perguntar as novidades. Todos mostraram um enorme respeito por ele lá dentro, como aquele que todos o demonstravam cá fora.
Sempre nas calmas, sempre na paz, afável, apaziguador, sem stress, respeitador, inteligente, com um brilho nos olhos de admiração pelas pessoas e pelo o mundo, o Snake era um indivíduo único que faria mudar de ideias até a pessoa mais preconceituosa e céptica do mundo. Faria mudar de ideias a todos aqueles que, ignorantemente e cobardemente, vão deixando disparates nas páginas dos jornais online e afins.
Sonhos não lhe faltavam, projectos também não. Era raro não me contar tudo o que andava a planear quando nos encontrávamos, e quando o fazia, notava-se o empolgamento em todo o seu ser. Já tínhamos combinado que eu produziria alguns instrumentais para os seus projectos, e certamente que eu iria dar o litro pois ele merecia o melhor.
Concluindo: o Snake não tinha bebido, não tinha fumado, tinha carta e documentos em dia. Apenas regressava a casa, e por distracção ou por vontade (todos os condutores o fazem ocasionalmente), fez inversão de marcha num local proibido, mas onde o tracejado até está apagado. Eram 5 da manhã. Dificilmente estaria a por a vida em risco de outros condutores ou pessoas, mas ainda assim, a policia decide disparar para matar, indo contra as suas próprias leis, tirando a vida a quem não merecia. Ficou a família, uma filha, amigos e milhares de pessoas que o vão guardar para sempre no coração.
R.I.P. Snake
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